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Monday, April 23, 2007

Na Cidade




No Cais do Sodré, hoje pelas 14h e 30m
(como se o local e a hora importassem)

Thursday, April 19, 2007

só isto

Se houvesse alguma certeza
de que realmente existimos
não sentiriamos esta tristeza infinita
nem a urgência de continuar
apesar de tudo



Wednesday, April 18, 2007

quase qualquer coisa


Onde é o meu lugar? Alguém me diz????


Sunday, April 15, 2007

este é o meu mundo
Tartarugas, patos e patinhos
Todos os dias me espanto
com a variedade do mundo
Como se todos os dias
o visse pela primeira vez

Monday, April 09, 2007

A ordem dos mares
praia das maçãs, 2007

um oceano são milhões ondas que balouçam
ao som da mesma música
uma onda são milhões de gotas de água
que se quebram à mesma voz
Quem se esqueceu ao que vinha?
Quem se perdeu dos outros?
Para onde vai o oceano se as ondas
partem em debandada em direcção oposta?
E se os milhões de gotas se evaporassem
antes que as ondas ganhassem forma?
Se as ondas murchassem
pelo abandono das gotas?
Porque andamos distraídos de nós?
Despenteando as ondas, agitando o mar,
fugindo de nós como gotas dispersas

Friday, April 06, 2007

antes da demolição
rua da mãe d'água, lisboa 2007

os gatos ocupam as ruínas

habitam os espaços

sugam-lhes as memórias

miam cios entre madeiras podres

espreitam por janelas vagas

nascem nos cantos onde as tábuas dão de si

os gatos sentem os sítios

vivem por ali

escutam o que já não está

- a menina do piano que recita

e o vizinho de cima que vomita

pelas escadas, roçam os chinelos velhos

da porteira de bigode

e o marido dela é ainda guarda nocturno -

lisboa cheira a naftalina e a vergonha

e nas janelas há rubor das sardinheiras

os gatos das casas abandonadas

habitam as ruínas das casas sozinhas

e nem se ralam se os inquilinos do passado

já não pagam renda


Thursday, April 05, 2007

fragmentos de luz
jardim botânico, 2007

A vida corre igual, num ramerrame suave, quase alheia ao milagre da Primavera. É preciso tempo para estar atento. Flagrar os momentos em que tudo parece na iminência do sonho é a receita da felicidade.



Sunday, April 01, 2007

Amigos
(todos os dias até ao fim)
Xumi, praia das maçãs, 2007


Todos os dias, bem cedo, Xumi faz o caminho desde casa até ao largo do quiosque na Praia das Maçãs. São uns dois quilómetros bem puxados, mas Xumi sabe que não pode faltar ao encontro como seu amigo, sr. Manuel.
Segue, alquebrado de artroses e reumáticos, pela linha do eléctrico, chega à praia, atravessa na passadeira e fica à espera que o amigo chegue. O sr. Manuel, sempre ocupado a tratar dos gatos que ali arribam na maré do abandono, chega depois. Xumi recebe-o com abanos de cauda e olhos de água rasos de ternura e saudade e o sr. Manuel diz-lhe palavras calorosas de amigo. Senta-se o homem de olhos de mar depois das tarefas do coração a ler uma qualquer revista ou livro. Xumi deita-se perto dele, suspirando aliviado pelo descanso depois da viagem. Ali ficam até ao almoço: o cão dormita, o homem vai falando com quem passa. Depois, chega o almoço. O sr. Manuel faz sinal aos carros para andarem mais devagar, para darem tempo a Xumi de atravessar a rua, almoçam os dois, o homem toma uma bica, dá dois dedos de conversa e chega-se ao amigo: Então Xuminho, vamos lá? E de novo voltam para o outro lado do passeio: o cão ansioso para se deitar e descansar as pernas, o homem para acabar a leitura. Por volta do fim do dia, o sr. Manuel levanta-se e vai buscar o jeep estacionado do outro lado da rua. Xumi não o segue. Está já muito cansado, dói-lhe o corpo, as pernas balançam como canas ao vento, o frio do mar entra-lhe como facas pelos ossos. Fica no passeio à espera que o amigo dê a volta e traga o carro até ele. Depois deixa que o sr. Manuel lhe pegue ao colo e o meta no carro. Chegados à casa onde Xumi vive, o sr. Manuel pára o carro, pega no amigo ao colo, desce-o do jeep, despede-se dele com uma festa na cabeça e entra no carro para voltar para a sua terra, a Praia das Maçãs. Dá a volta ao jeep e antes de entrar de novo na estrada olha para trás, para onde Xumi está parado, acena e diz: Até amanhã, amigo.
Então o cão velho afasta-se e ruma, cambaleante, a casa.
Amanhã, pela manhã, tudo recomeça. É assim o amor.
(Quem ousa falar em hierarquia de seres vivos? Quem defende que o homem é o único animal que sente amor? Quem cegou a esse ponto? O mundo é ainda um lugar de esperança quando a amizade atravessar raças, credos, cores e espécies.)

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